A agricultura ao serviço do País

Portugal pode produzir<br>mais e melhor

João Frazão

Um dos eixos cen­trais da po­lí­tica al­ter­na­tiva pa­trió­tica e de es­querda que o PCP propõe ao povo por­tu­guês passa pela va­lo­ri­zação e o re­forço da pro­dução na­ci­onal, con­dição es­sen­cial para a cri­ação de ri­queza, para subs­ti­tuir o mo­delo em que se produz cada vez menos e se im­porta e se deve cada vez mais, para um mo­delo em que se pro­duza cada vez mais e se im­porte e se deva cada vez menos.

A in­te­gração de Por­tugal na então CEE tra­duziu-se na in­vasão do mer­cado na­ci­onal de pro­du­ções dos grandes pro­du­tores agrí­colas e na en­trada de pro­dutos de países ter­ceiros

Sector cen­tral nesta equação é o agro-ali­mentar, cujo dé­fice da ba­lança de pa­ga­mentos se si­tuou, em 20131, em 3,7 mil mi­lhões de euros ne­ga­tivos. Ou seja, os pro­du­tores por­tu­gueses ex­por­taram na agri­cul­tura, pe­cuária, pescas e sil­vi­cul­tura cerca de 3,5 mil mi­lhões de euros, en­quanto que o que o País im­portou para fazer face às ne­ces­si­dades ali­men­tares do nosso povo, nos mesmos sec­tores, foi su­pe­rior a 7,2 mil mi­lhões de euros.

Com­pa­ra­ti­va­mente com 2012 o dé­fice agravou-se em 39 mi­lhões de euros. Entre 1999 e 2009 o dé­fice agro-ali­mentar agravou-se em 23, 7 por cento.

Na pri­meira po­sição das im­por­ta­ções agrí­colas estão os ce­reais e as ole­a­gi­nosas, para ali­men­tação hu­mana e animal, que as­cendem a mais de mil e du­zentos mi­lhões de euros, valor que tem vindo a crescer. Re­a­li­dade tanto mais gri­tante quanto nos campos do Alen­tejo so­bejam mi­lhares de hec­tares que apenas se de­dicam à cul­tura do sub­sídio, ainda que para isso lá po­nham meia dúzia de ani­mais a pastar, e de­zenas de mi­lhares de braços pa­rados no de­sem­prego. Vêm de­pois os ani­mais vivos, cujo valor ul­tra­passa os 200 mi­lhões de euros, valor também cres­cente. Na lista estão ainda os frutos frescos e as ba­tatas com va­lores pró­ximos dos 90 mi­lhões de euros cada.

Onde pára o mi­lagre agrí­cola?

 Como jus­ti­ficar um tal ce­nário quando, di­a­ri­a­mente, nos en­tram pelos olhos dentro, em­pur­rados pela má­quina de pro­pa­ganda em que está trans­for­mado o Mi­nis­tério da Agri­cul­tura, su­cessos e avanços da la­voura na­ci­onal?

Então não temos nós os mai­ores oli­vais do mundo? E a pro­du­ti­vi­dade no nosso to­mate para a in­dús­tria não é das mai­ores da Eu­ropa? E as ex­por­ta­ções de hor­tí­colas não ul­tra­pas­saram os mil mi­lhões de euros? E os vi­nhos por­tu­gueses não pe­ne­tram em cada vez mais mer­cados in­ter­na­ci­o­nais?

Na ver­dade, fruto da po­lí­tica de re­cu­pe­ração ca­pi­ta­lista e de con­cen­tração fun­diária, fruto da po­lí­tica de di­reita le­vada a cabo nos úl­timos 38 anos pelos go­vernos do PS, PSD e CDS, à du­a­li­dade an­ces­tral da agri­cul­tura por­tu­guesa (a Sul, o la­ti­fúndio, com her­dades que che­gavam aos vinte mil hec­tares, ex­plo­radas à renda ou com uma agri­cul­tura ex­ten­siva, com vastas áreas ao aban­dono, em cou­tadas de caça, con­de­nando ao de­sem­prego e à mi­séria mi­lhares de ope­rá­rios agrí­colas que nada mais ti­nham para ga­rantir o seu sus­tento do que a sua força de tra­balho; a Norte, a re­gião do mi­ni­fúndio onde mi­lhares de pe­quenos agri­cul­tores moi­re­javam de sol a sol para gran­jear o parco ali­mento para si e para os seus) junta-se agora a du­a­li­dade de uma agri­cul­tura mo­derna, pu­jante, in­ten­siva e super-in­ten­siva, de ma­triz ca­pi­ta­lista, com acesso a todos os apoios e pri­vi­lé­gios e a pe­quena agri­cul­tura des­pre­zada pelo poder po­lí­tico, sem acesso a apoios e aos mer­cados, cada vez mais dis­cri­mi­nada e es­ma­gada.

De um lado, um mo­delo de ex­plo­ração da terra que, be­ne­fi­ci­ando dos in­ves­ti­mentos pú­blicos, de­sig­na­da­mente no Al­queva, as­senta a sua ac­ti­vi­dade na ex­plo­ração in­ten­siva e super-in­ten­siva dos ter­renos, que os le­varão à exaustão, e de mão-de-obra, em con­di­ções por vezes de es­cra­va­tura, por grupos eco­nó­micos que ou levam o pro­duto para trans­for­mação fora do País ou levam a ri­queza criada e os res­pec­tivos im­postos.

De outro lado, as mais de 400 mil ex­plo­ra­ções agrí­colas que de­sa­pa­re­ceram desde a en­trada de Por­tugal na CEE/​UE, à razão de duas por dia, de que a si­tu­ação da pro­dução de leite é talvez o exemplo mais ilus­tra­tivo, tendo pas­sado de 61 mil ex­plo­ra­ções na cam­panha de 93/​94 para menos de sete mil nos dias de hoje, no au­mento da área média por ex­plo­ração, que só entre 1999 e 2009 au­mentou 30 por cento, de 9,8 ha para 12,7 ha, e no cerca de meio mi­lhão de hec­tares que nesse pe­ríodo ficou aban­do­nado.

A PAC como ins­tru­mento
de des­truição da nossa agri­cul­tura

A in­te­gração de Por­tugal na então CEE, cul­mi­nando um trá­gico pro­cesso de ne­go­ci­a­ções de pré-adesão, agra­vado com a de­cisão de an­te­cipar o fim de me­didas de tran­sição en­tre­tanto ne­go­ci­adas, que vi­savam mi­ni­mizar os im­pactos ne­ga­tivos, tra­duziu-se na in­vasão do mer­cado na­ci­onal de pro­du­ções dos grandes pro­du­tores agrí­colas do centro e do Norte da Eu­ropa e na en­trada de pro­dutos de países ter­ceiros. Com acordos bi­la­te­rais de livre co­mércio, nor­mal­mente ne­go­ci­ados com pre­juízo grave para os pe­quenos e mé­dios agri­cul­tores eu­ro­peus, a UE abriu as portas para a en­trada de pro­dutos agrí­colas, para abas­tecer a grande agro-in­dús­tria e agro-dis­tri­buição in­ter­na­ci­o­nais, como moeda de troca da aber­tura desses mer­cados aos pro­dutos tec­no­ló­gicos e de ser­viços dos países do Norte e centro da Eu­ropa.

Em 1985, o PCP afir­mava num do­cu­mento ao povo por­tu­guês que «com a adesão à CEE, na agri­cul­tura, os preços ao pro­dutor bai­xa­riam con­si­de­ra­vel­mente; mi­lhares e mi­lhares de ex­plo­ra­ções agrí­colas se­riam li­qui­dadas; avan­çaria uma de­sas­trosa eu­ca­lip­ti­zação do País; a área cul­ti­vada seria re­du­zida; seria im­posto a ar­ranque de vinha aos pro­du­tores di­rectos».

PS, PSD e CDS são res­pon­sá­veis por, 29 anos de­pois, a si­tu­ação da agri­cul­tura ser a que aqui se des­creve.

PS, PSD e CDS es­ti­veram de acordo com as cam­pa­nhas de ar­ranque da vinha, os apoios para abate das ex­plo­ra­ções lei­teiras, os apoios que obri­gavam os agri­cul­tores a não pro­duzir (o cha­mado set-aside), pri­meiro, e com os apoios sem qual­quer obri­gação de pro­duzir ali­mentos, de­pois. Es­ti­veram de acordo com a proi­bição de pro­dução de ta­baco ou de be­ter­raba sa­ca­rina, ou a nor­ma­li­zação for­çada de frutas e le­gumes, para a qual foi ne­ces­sário re­a­lizar avul­tados in­ves­ti­mentos, sem que es­ti­vesse ga­ran­tido o res­pec­tivo re­torno.

Os mi­lhões en­tre­tanto en­trados no nosso País têm sido ca­na­li­zados para a sus­ten­tação dos ditos com­pe­ti­tivos, os que in­vestem, pro­duzem e co­lhem à sombra de apoios mi­li­o­ná­rios na­ci­o­nais e co­mu­ni­tá­rios. Bas­tará dizer que, no que aos pa­ga­mentos di­rectos diz res­peito (o pri­meiro pilar da PAC), 30 por cento dos di­reitos atri­buídos aos agri­cul­tores que re­ce­biam menos de 250 euros por ano (os pe­quenos agri­cul­tores) já de­sa­pa­re­ceram e que apenas 12 por cento dos be­ne­fi­ciá­rios, os mai­ores, re­cebem cerca de 80 por cento das ajudas, en­quanto 68 por cento dos be­ne­fi­ciá­rios re­cebem apenas sete por cento das ajudas.

Re­forma da PAC – mais do mesmo

En­tre­tanto, a nova re­forma da PAC, re­cen­te­mente apro­vada na UE e em fase de im­ple­men­tação nos es­tados membro, não só man­terá esta re­a­li­dade, como a po­derá mesmo agravar.

De facto, como o nosso Par­tido as­si­nalou opor­tu­na­mente, esta re­forma da PAC, que o Go­verno PSD/​CDS saudou como mais uma vi­tória, na senda aliás do que ti­nham feito os seus an­te­ces­sores, é má para a agri­cul­tura fa­mi­liar e, logo, para Por­tugal, por cinco ra­zões es­sen­ciais:

  1. Porque não ga­rante a se­gu­rança e a so­be­rania ali­men­tares do nosso povo;

  2. Porque não tem qual­quer pre­o­cu­pação com a ga­rantia de preços justos à pro­dução, factor es­sen­cial para mo­tivar a pro­dução, pre­vendo menor poder de in­ter­venção pú­blica nos mer­cados, de que são exem­plos par­ti­cu­lar­mente graves a abo­lição do sis­tema de quotas no leite, que con­du­zirá a uma baixa de preços na pro­dução e a um agra­va­mento no ren­di­mento dos agri­cul­tores, no­me­a­da­mente dos pe­quenos e mé­dios, e, em úl­tima aná­lise, à eli­mi­nação destes, e dos di­reitos de plantio da vinha que re­ti­rará um im­por­tante ac­tivo aos agri­cul­tores;

  3. Porque mantém o des­li­ga­mento das ajudas, ad­mi­tindo apoios sem obri­ga­to­ri­e­dade de pro­duzir, o que terá como con­sequência a di­mi­nuição da pro­dução e o agravar do dé­fice na ba­lança de pa­ga­mentos agro-ali­men­tares;

  4. Porque in­siste numa in­justa dis­tri­buição das ajudas entre países, pro­du­ções e pro­du­tores, ca­na­li­zando os apoios para os grandes pro­pri­e­tá­rios e não as­se­gu­rando os apoios à pe­quena e média agri­cul­tura, o que agra­vará as as­si­me­trias;

  5. Porque au­menta a com­ple­xi­dade do sis­tema, no­me­a­da­mente no pri­meiro pilar, com o ob­jec­tivo de também nesta ma­téria fazer uso do poder dis­cri­ci­o­nário já que li­mita a pró­pria to­mada de po­sição por parte dos agri­cul­tores e dos ci­da­dãos.

Mas se a ar­qui­tec­tura da Re­forma é má, as op­ções em Por­tugal, que po­de­riam mi­ni­mizar al­guns as­pectos ne­ga­tivos, ainda a pi­oram.

O Go­verno PSD/​CDS, su­bli­nhando a sua opção de classe, as­sumiu di­versas de­ci­sões que são al­ta­mente le­sivas para a pe­quena e média agri­cul­tura. Desde logo o alar­ga­mento da área mí­nima para um agri­cultor se poder can­di­datar às ajudas, que passa de 0,3 ha para 0,5 ha, ad­mi­tindo-se mesmo que venha a au­mentar para um hec­tare, o que ex­cluirá mi­lhares de pe­quenos agri­cul­tores; a não apli­cação da mo­du­lação e do pla­fo­na­mento e a não re­gi­o­na­li­zação das ajudas; a de­cisão de não abrir ne­nhuma me­dida es­pe­cí­fica para pe­quenos agri­cul­tores no âm­bito do novo PDR; a de­cisão de não atri­buir uma ma­jo­ração aos pri­meiros 13 ha de cada ex­plo­ração, que ob­vi­a­mente fa­vo­re­ceria quem tem menos terras; a subs­ti­tuição de uma mo­du­lação de 10 por cento apli­cada só a quem re­cebia acima de 5000 euros, por uma re­dução de oito por cento apli­cada a todos os agri­cul­tores.

Um Go­verno ao ser­viço
do grande agro-ne­gócio

Trata-se de de­ci­sões de um Go­verno que, como atrás se disse, tem uma opção de classe também na agri­cul­tura, e cujo Mi­nis­tério da Agri­cul­tura foi ocu­pado pelos re­pre­sen­tantes dos grandes agrá­rios e do grande agro-ne­gócio.

Numa ope­ração de grande fô­lego, o CDS/​PP e a CAP vêm ins­ta­lando os seus qua­dros em toda a es­tru­tura do Mi­nis­tério. A partir dessas po­si­ções, levam a cabo um con­junto de me­didas que con­vergem para o duplo ob­jec­tivo de ex­pulsar mi­lhares de pe­quenos agri­cul­tores da ac­ti­vi­dade e fa­ci­litar a con­cen­tração fun­diária. Assim é com as al­te­ra­ções à lei dos Bal­dios, que visa roubar aos com­partes, seus le­gí­timos donos, a posse, a gestão e o uso dos bal­dios; com a lei que ex­tingue a Casa do Douro, li­qui­dando a única es­tru­tura que po­deria de­fender a pe­quena vi­ti­vi­ni­cul­tura du­ri­ense no ins­tável equi­lí­brio com o co­mércio; com as novas re­gras fis­cais que obrigam todos os agri­cul­tores a co­lectar-se nas Fi­nanças para po­derem vender os poucos ex­ce­dentes da sua pro­dução, com que com­ple­mentam as parcas re­formas e pen­sões, e que já teve como con­sequência ime­diata a re­dução na ac­tual cam­panha de cerca de 15 mil can­di­da­turas ao Re­gime de Pa­ga­mento Único; com a lei da flo­res­tação e re­flo­res­tação que au­to­riza o plantio de eu­ca­liptos apenas com uma in­for­mação prévia, e que previu no PDR 2104/​2020 apoios para a plan­tação desta es­pécie.

Agri­cul­tura por­tu­guesa tem fu­turo

Por­tugal pode pro­duzir mais e me­lhor, ali­mentos de qua­li­dade, para, em pri­meiro lugar, ali­mentar o nosso povo.

Du­rante anos ou­vimos a te­oria do País de solos po­bres e do clima di­fícil para a pro­dução agrí­cola. No en­saio «Con­tri­buição para o Es­tudo da Questão Agrária», que as Edi­ções Avante! agora re­e­di­taram, o ca­ma­rada Álvaro Cu­nhal, apro­fun­dando o es­tudo da re­a­li­dade nos campos, afirma que «não há qual­quer lei na­tural, quais­quer ra­zões bi­o­ló­gicas ou téc­nicas, qual­quer fra­queza da es­pécie hu­mana, que forcem a agri­cul­tura, [e o País, acres­cen­tamos nós] ao atraso. Apenas fac­tores so­ciais [e op­ções po­lí­ticas] a isso a obrigam.»

A questão está, pois, na ne­ces­si­dade e ur­gência de dar força a outra po­lí­tica. Uma po­lí­tica que, como afirma o pro­grama do Par­tido, «de­verá ter como ob­jec­tivos cen­trais o de­sen­vol­vi­mento e a mo­der­ni­zação da agri­cul­tura por­tu­guesa, a me­lhoria da vida nos campos, o au­mento da pro­du­ti­vi­dade e da pro­dução agrí­cola, pe­cuária e flo­restal, a me­lhoria do grau de auto-abas­te­ci­mento de pro­dutos ali­men­tares es­sen­ciais, vi­sando ga­rantir a so­be­rania e se­gu­rança ali­men­tares, o má­ximo in­cre­mento das pro­du­ções em que Por­tugal possa dispor de van­ta­gens com­pa­ra­tivas e a ma­nu­tenção do mundo rural».

Uma po­lí­tica que, desde logo, tem de ga­rantir preços com­pen­sa­dores à pro­dução, pois se os agri­cul­tores re­ce­berem um preço justo, lan­çarão as se­mentes à terra e cui­darão das suas pro­du­ções, ao mesmo tempo que im­peça a es­pe­cu­lação com os preços dos fac­tores de pro­dução – adubos, ra­ções, com­bus­tí­veis, se­mentes, pro­dutos fito-far­ma­cêu­ticos, ma­qui­naria.

Que con­trole os mi­lhares de to­ne­ladas de ali­mentos que en­tram por essas fron­teiras e que ar­ruínam a agri­cul­tura na­ci­onal, de que, re­pete-se, o caso do leite e dos pro­dutos lác­teos é par­ti­cular exemplo.

Que im­peça que as grandes ca­deias de dis­tri­buição en­gordem à conta dos pro­du­tores com mar­gens de lucro abu­sivas e com prazos de pa­ga­mento in­su­por­tá­veis.

Que rompa com a ló­gica da PAC e que, re­co­nhe­cendo a es­pe­ci­fi­ci­dade da agri­cul­tura por­tu­guesa, vá no sen­tido da re­dis­tri­buição das ajudas, li­gando-as à pro­dução, e ga­ran­tindo um ren­di­mento justo aos pe­quenos e mé­dios agri­cul­tores, que dê pri­o­ri­dade ao apoio aos pro­jectos da agri­cul­tura fa­mi­liar e dos pe­quenos e mé­dios agri­cul­tores, à pro­dução na­ci­onal e ao con­sumo in­terno, que ga­ranta os ins­tru­mentos de re­gu­la­men­tação da pro­dução e dos mer­cados, como as quotas lei­teiras e os di­reitos de plan­tação da vinha.

Que, rom­pendo com a po­lí­tica de di­reita, com­bata o en­cer­ra­mento de ser­viços pú­blicos – es­colas, cen­tros de saúde, re­par­ti­ções de Fi­nanças, trans­portes pú­blicos, câ­maras e fre­gue­sias, que des­troem o nosso mundo rural.

Que ponha a terra a pro­duzir, de­sig­na­da­mente re­a­li­zando uma nova Re­forma Agrária nos campos do Sul, com a li­qui­dação do la­ti­fúndio e a en­trega da terra a quem a tra­balhe.

A luta por estes ob­jec­tivos, em de­fesa dos pe­quenos e mé­dios agri­cul­tores, da agri­cul­tura fa­mi­liar e do mundo rural, em de­fesa do di­reito de pro­duzir para ali­mentar o nosso povo, luta pela se­gu­rança e so­be­rania ali­men­tares, só pos­sí­veis com a rup­tura com a po­lí­tica de di­reita, é, enfim, a luta pela po­lí­tica al­ter­na­tiva pa­trió­tica e de es­querda, vin­cu­lada aso va­lores de Abril.
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1 INE – Julho de 2014

 

O es­tranho caso
da be­ter­raba sa­ca­rina

Antes do 25 de Abril a cul­tura de be­ter­raba sa­ca­rina no Con­ti­nente cho­cava com os in­te­resses dos grupos mo­no­po­listas na­ci­o­nais e es­tran­geiros que ex­plo­ravam grandes plan­ta­ções de cana de açúcar em An­gola e Mo­çam­bique, e as duas re­fi­na­rias em Por­tugal.

Em 1977, o go­verno PS/​Mário So­ares de­ter­minou a sus­pensão do pro­jecto de in­tro­dução da cul­tura de be­ter­raba.

O Acto de Adesão à CEE fixou a quota mí­nima e in­su­fi­ci­ente de 60 mil to­ne­ladas de açúcar branco para Por­tugal. Nem assim ar­rancou a pro­dução de açúcar a partir da be­ter­raba sa­ca­rina!

En­tre­tanto, as duas re­fi­na­rias (Tate & Lyle e RAR), que con­ti­nu­aram a im­portar ramas e açúcar dos países ACP, ga­ran­tiam lu­cros de 302 dó­lares/​ton. Ou seja, em 10 anos, cerca de 200 mi­lhões de dó­lares! Isto sem contar com o di­nheiro que en­tre­gámos a Es­panha para trans­formar nas suas re­fi­na­rias a be­ter­raba que, en­tre­tanto, se ia pro­du­zindo em Por­tugal!

A con­cre­ti­zação da re­fi­naria, em Junho de 1997, acabou por se fazer com cerca de 50 mi­lhões de euros de fundos pú­blicos, 60 por cento do total in­ves­tido!

Em 2006, aquando do de­bate na União Eu­ro­peia sobre a OCM do açúcar no sen­tido de re­duzir a pro­dução eu­ro­peia em seis mi­lhões de to­ne­ladas até 2009/​2010, o go­verno PS/​José Só­crates aceitou a re­dução da quota por­tu­guesa das 70 mil to­ne­ladas para 15 mil to­ne­ladas, em dois anos, li­qui­dando a pro­dução de be­ter­raba sa­ca­rina em Por­tugal.

A re­fi­naria foi re­con­ver­tida para re­finar ramas de cana, o que custou 12 mi­lhões de euros e os pro­du­tores de be­ter­raba terão re­ce­bido 6,4 mi­lhões de euros para re­con­ver­terem a cul­tura!

Assim, cerca de mil agri­cul­tores no Vale do Sor­raia (e até no Vale do Mon­dego) que se ti­nham es­pe­ci­a­li­zado na pro­dução de be­ter­raba sa­ca­rina, atin­gindo pro­du­ti­vi­dades ele­vadas de mais de 90 mil to­ne­ladas/​hec­tare, bem acima do nível médio da Eu­ropa, aban­do­naram esta pro­dução e Por­tugal voltou a im­portar ramas de cana de açúcar.